Com 255 casos confirmados da Covid-19 e outros 161 sob investigação, Santa Quitéria já contabiliza 10 óbitos pela doença. O elevado número fez o prefeito Tomás Figueiredo (PMDB) decretar, no último dia 22, a adoção de “toque de recolher” na cidade, proibindo a circulação de pessoas, exceto quando necessário para acesso aos serviços essenciais ou para sua prestação, ou em caso de urgência. A medida é válida de 19 horas às 5 horas de segunda a sexta-feita e a partir das 14 horas nos fins de semana e vigora até amanhã (1º).
No entanto, o decreto foi considerado inconstitucional pelo Ministério Público do Estado do Ceará, que enviou, no último dia 25, uma recomendação para que fosse revogado. A Prefeitura de Santa Quitéria, que manteve o toque de recolher, regulado pelo decreto 015/2020, respondeu à Recomendação através da Procuradoria Geral do Município, mas o MPCE manteve sua decisão e agora a gestão deverá sofrer uma Ação Civil Pública.
Segundo o prefeito, a decisão para adotar o toque de recolher veio a partir de uma reunião com representantes da Polícia Militar e Civil, além de autoridades de Saúde. Uma das justificativas é o elevado número de pessoas que chegam ao Município de cidades vizinhas, como Monsenhor Tabosa, Catunda, Varjota e Hidrolândia, para realizar transações bancárias e receber o auxílio emergencial.
A exemplo de Catunda, que também adotou o toque recolher, Tomás Figueiredo acredita que a medida evita a ida a bares, que ainda mantiveram as portas abertas ilegalmente, e coíbe a movimentação da cidade no período noturno. A Polícia Militar está dando apoio na aplicação da medida “com muita dificuldade porque tem redução do pessoal”, admite o prefeito. Conta ainda com apoio do Departamento Municipal de Trânsito e bombeiros civis. “A gente conseguiu manter o decreto pacificamente”, completa Tomás.
O temor da gestão quanto ao crescente número de casos deve-se também a ausência de leitos de UTI no Município. Os pacientes graves são encaminhados para a cidade de Sobral, que está com 86.87% de taxa de ocupação.
Inconstitucional
O MPCE, através dos promotores Marina Romagna Marcelino ou Déric Gunck Leite, enviou a Recomendação justificando que o “toque de recolher” não se confunde com a “quarentena” e que a medida foi adotada “sem base em evidências científicas e em análises sobres as informações estratégicas em saúde”. Além disso, o órgão ministerial reforçou que não há fundamento jurídico, já que a medida “só pode ser adotada pelo Presidente da República e em caso de defesa e estado de sítio ou de guerra declarada”.
O órgão ainda reforça que a Polícia Militar só se subordina ao Governo do Estado, sendo inconstitucional esta medida de restrição de horário. Com isso, o MPCE deu 48 horas para o prefeito anular o decreto e pediu o encaminhamento dos estudos científicos que basearam as medidas de isolamento social em Santa Quitéria. Uma Recomendação semelhante foi enviada a Catunda, que revogou a medida após intervenção dos promotores realizada dez dias após o decreto vigorar.
Para Figueiredo, a demora para enviar a Recomendação à Catunda, quando só restava dois dias para encerrar o “toque de recolher”, causa estranheza, já que houve muita agilidade para pedir a revogação do decreto em Santa Quitéria. “Por que nesses 11 dias de Catunda não tomaram atitude?”, provocou. O gestor do Município sugeriu ainda que o pedido para revogação “pode ter motivação política”, ao citar que o irmão de um dos promotores “era da gestão passada”. Tomás enfatiza também que o decreto foi respaldado pelos decretos estaduais e pela lei federal lei 13.1979/2020. Esta lei citada, de 6 de fevereiro de 2020, não menciona “toque de recolher”, mas diz que podem ser adotadas, por conta da Covid-19, medidas de “isolamento” e “quarentena”. Além disso, Tomás reforça que o MPCE foi convidado para reunião que decidiu pelo endurecimento das medidas a fim de frear o avanço do vírus. “Nos baseamos no ‘toque de recolher’ de Catunda e de outros municípios”, justificou.
O Sistema Verdes Mares procurou, via assessoria de comunicação do MPCE, os promotores de Justiça citados. Eles disseram preferir aguardar o desenrolar dos fatos na semana que vem para se manifestarem sobre o assunto.
Fonte: Diário do Nordeste.